segunda-feira, 19 de outubro de 2015

QUAL A SUA ARMA?


A historia de Edson, morador do ABC Paulista.
 
           Todos os dias eu seguia a mesma rotina. Acordava ás 5h30, tomava banho, me arrumava, tomava uma xícara de café, escovava meus dentes e corria para o ponto de ônibus. Sentava no fundo, colocava meu fone e seguia para o meu trabalho. Todo dia era a mesma coisa. Um dia resolvi mudar, não coloquei meu fone, comecei a observar as pessoas que estavam naquele ônibus. Até que um rapaz que estava há dois bancos do meu, me fez parar. Ele usava roupas largas, boné, fones de ouvido e sua expressão era séria. Reparei em seu olhar perdido, porém esperançoso. Suas mãos eram calejadas, suas roupas surradas, mas muito perfumadas. Parecia-me acreditar em Deus, antebraço tatuado com a frase : “Deus é fiel” e no punho uma cruz. Aparentava ter 25 anos. Minha observação se encerrou, quando subitamente se levantou e deu sinal para descer.

No outro dia, lá estava o rapaz, porém algo estava diferente, sua feição. O rosto sério deu lugar há um singelo sorriso. Parecia-me radiante, até cantarolava um rap. Suas roupas também estavam diferentes, vestia uma camisa “Polo” , calça jeans e um sapato velho. Estava arrumado, mas nada chamava mais atenção do que seu sorriso. Enquanto cantarolava, uma senhora que estava ao seu lado, se levantou e disse que não ficaria perto de um marginal. O rapaz escutou, mas nada apagou seu sorriso. Ele deu sinal e desceu. Não sei o que me chamou a atenção, talvez fosse seu estilo, a maneira como os outros o olhavam, mas naquele dia sua alegria me despertou a curiosidade.
Na manhã seguinte, não o vi, nem no outro dia e nem no outro. Certamente, ele havia mudado seu horário. Quatro dias se passaram. Estava na sala com minha mãe, que assistia seu programa policia favorito, quando na tela apareceu a foto do rapaz do ônibus.  

Edson, 22 anos, morador da Periferia do Grande ABC Paulista. Pai de um menino de 3 anos. A mãe da criança faleceu no parto. Morava com sua mãe, seu filho e seus 4 irmão menores de idade. Seu pai estava preso. Trabalhava em uma gráfica para sustentar sua família e fazia curso técnico durante a noite. Dançava Hip Hop e todo sábado ensinava dança e Grafitti para crianças carentes. Aquele dia, o ultimo em que o vi, ele estava a caminho de seu primeiro emprego digno, iria receber R$ 1.600,00 mais benefícios, e esse era o motivo de sua alegria.
Quando estava chegando para entregar seus documentos, foi surpreendido por uma ação policial. Mandaram ele encostar na parede. Perguntaram o que ele estava fazendo lá e o motivo de tanta pressa. Edson levou a mão ao bolso, quando um disparo foi ouvido. Naquele momento um sorriso foi apagado, sonhos roubados e esperanças tiradas. Edson foi ao chão com uma bala em seu peito. Naquele momento o policial viu que o rapaz segurava sua carteira de trabalho. Sua arma era o seu conhecimento, sua vontade em vencer e sua fé. Os policiais tentaram alterar a historia, mas testemunhas os denunciaram.

            Essa é a historia de Edson, mas pode ser a historia de tantos outros jovens de origem humilde, que saem da periferia para buscarem algo melhor para suas vidas e para suas famílias. Jovens com tantos sonhos, vitimas do preconceito e da injustiça. Essa crônica é em homenagem a todos aqueles que perderam suas vidas por causa e para a violência.

            Hoje Edson não pode mais ouvir seus “rap boladão”, mas sua historia não foi esquecida, pelo menos não por mim.  

3 comentários:

  1. A mesma história de que o negro, humilde e da periferia, morre sempre nas mãos de policiais.
    Entrei na página com uma outra expectativa e acho que se aqui é espaço pra diversidade, propagar esse tipo de preconceito as avessas não faz sentido.

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    1. A cultura não visa estimular o ódio, a ideia é passar sempre uma realidade que nem todos veem ou entendem, passamos por isso todos os dias e ninguém se importa, esse é só um relato do cotidiano de muitos. O preconceito quem faz é aquele q julga quem se interessam a passar cultura tão pouco reconhecida.

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  2. Fica fácil falar para quem não passa por isso todos os dias, a rua ta ai pra mostrar.. que preconceito racial e social existe sim. Porque o mesmo não acontece com aquele que não mora na periferia, que não conhece o que cada um passa todos os dias.. esse é só mais um relato da realidade. É triste? Mas é a real. Acompanhe as postagens do resto do blog para entender a essência!

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